Editorial – Brasil e o flerte com a força
Movimentos sociais não podem ser ignorados. Foto: acervo OTB
Por Paulo Campos dia em OTB no Brasil

Agência Trabalhador – São Paulo
Paulo Campos é vice-presidente nacional da Ordem dos Trabalhadores do Brasil
EDITORIAL
E lá vamos nós, brasileiros.
Após quase três semanas da divulgação do resultado das eleições presidenciais, continua o movimento dos que não se conformam com o resultado. Não que seja nova esta situação, vimos as reclamações sem fim do candidato Aécio Neves quando derrotado por Dilma Rousseff em 2014, mas há diferenças importantes.
É importante ressaltar que a OTB não expressa apoio a qualquer lado nesta disputa, conferindo a seus membros liberdade para se posicionar de maneira independente. Este texto analisa a conjuntura atual e seus reflexos na sociedade e tem por objetivo informar o leitor.
É preciso, para compreender este momento brasileiro, voltar no tempo e compreender de que maneira, por exemplo, Donald Trump, alçou o posto mais alto no mundo, auxiliado por uma rede dirigida pelo estrategista político Steve Bannon que disseminou todo tipo de fakenew sobre seus adversários.
Para explicar, cada eleitor americano recebia pelas redes sociais, um Trump diferente. Os conservadores recebiam o Trump conservador, os religiosos recebiam o Trump religioso, os mais radicais recebiam a versão to Trump radical, das frases fortes, estratégia que termina por arregimentar um universo de seguidores que terminou por Elegê-lo presidente dos Estados Unidos.
Esta mesma estratégia, organizada pelo mesmo Steve Bannon, alçou Jair Bolsonaro ao poder.
E a questão aqui não é julgar sua validade, e sim registrar o que aconteceu, que agora faz parte da história e serve de aprendizado para todos.
O que deve preocupar os brasileiros é o futuro.
Temos visto manifestações daqueles que – bastante incentivados – não se conformaram com o resultado das eleições e que, diferentemente dos eleitores de Aécio Neves lá no distante 2014, foram levados a acreditar que um golpe de estado é a melhor solução para que seu candidato permaneça no poder.
Golpe de estado nunca foi boa solução em lugar algum do mundo na história.
Porém, tenho visto algo ainda pior se desenhando e que me motivou a escrever este texto dirigido a petistas, bolsonaristas, ciristas, tebetistas, cristãos, evangélicos, espíritas e a todos, bem no espírito da nossa OTB.
Tem sido divulgado em grupos de whatsapp e redes sociais a ideia de marcar comércios pertencentes àqueles que votaram no candidato da esquerda, pixando uma estrela vermelha nas portas – há ainda uma versão mais radical que deseja “marcar” pessoas lhes tatuando uma estrela vermelha – com objetivo de promover boicotes.
Uma pobre manicure teve seu nome divulgado com a orientação de que mulheres “de bem” não podem utilizar o serviço de uma petista.
A história nos conta que houve momento semelhante, onde foram pichadas estrelas de David nas portas dos estabelecimentos cujos donos eram judeus com orientação semelhante de que o povo alemão não deveria comprar ou se utilizar de serviços feitos por judeus.
O episódio descambou para a noite entre 9 e 10 de novembro de 1938, que terminou com mais de 1000 mortes de judeus, 8 mil estabelecimentos destruídos e cerca de 520 sinagogas incendiadas ou depredadas, 30 mil pessoas foram mandadas para campos de concentração.
E tudo partiu da ideia de “marcar” adversários para segregá-los.
O Brasil que eu conheço e que quero para meus filhos e netos não é assim. Somos um povo pacífico, nada afeito a guerras, solidário e alegre por natureza, somos todos mestiços, de origem europeia, indígena e negra principalmente, um povo caboclo, somos portugueses, italianos, tapuias, tupinambás, guaranis, somos quilombolas, iorubás e nagôs, somos judeus, cristãos, evangélicos, espíritas e gostamos da beleza da mitologia do candomblé e da brasilidade da umbanda.
O Brasil não é, e não podemos deixar que façam de nós, racistas, misóginos, homofóbicos e intolerantes, sendo que todos tem sua beleza e direito de se expressar.
Como numa final de campeonato de futebol, torcedores querem seu time campeão, mas todos amam o futebol e, mais importante, no esporte, a derrota não significa humilhação, ela ensina e dignifica. É esta lição que precisamos passar para as crianças.
Peço a todos que promovam, para si e para os seus, o exercício da avaliação. A informação chegou, procure saber se é verdade antes de divulgar. Uma sugestão estranha como esta de marcar estabelecimentos surge, procure saber se há, na história acontecimento semelhante e quais foram suas consequências.
Pense e decida por você mesmo.